BRAGA DESNORTEADA

Publico aqui uma crónica do jornalista do Jornal de Notícias Elmano Madaíl que achei interssante:

Braga anda a ser notícia, nos últimos dias, pelas piores razões, levando a crer que se trata de urbe disfuncional. O que é injusto. Embora padeça das dores do crescimento acelerado, a cidade reflecte, nos episódios que os jornais reportaram, as metástases que vão matando o país. Simplesmente, o acaso e a geografia quiseram que se concentrassem todos, e a um só tempo, no mesmo local. A verdade, porém, é que a demagogia de mau gosto quase terrorista, a estupidez que capitaliza a passividade de cidadãos deprimidos e mal formados, e a barbárie dos meninos mimados que pululam nas universidades não são um exclusivo bracarense. Longe disso.

Demagogia terrorista

Nem sempre os fins, por mais nobres que sejam, justificam os meios. A nobreza, porém, escasseia, e as boas intenções são o combustível do Inferno. O prudente adágio ficou provado com a publicidade abjecta que a União Distrital das Instituições Particulares de Solidariedade Social de Braga (UDIPSSB) publicou em dois diários bracarenses. Nela, a frase alarmista "Pode ser o seu filho!" - sim, exclamativa, como é uso dos boçais, que julgam fazer-se ouvir melhor gritando - acompanha a foto de um menino cheio de hematomas, que a UDIPSSB diz tratar-se do Rui, de 7 anos, e que terá sido insultado e agredido por frequentar o prolongamento de horário na sua escola, organizado pelas Associação de Pais e Junta de Freguesia. Ilegais, garante a UDIPSSB. Todavia, o Rui não existe e a situação, segundo a Segurança Social de Braga, nunca ocorreu - é inteiramente inventada para ilustrar a mensagem da UDIPSSB "Escolha para o seu filho um ATL legal e de confiança", que será, claro, um dos sócios da UDIPSSB. Ora, se a UDIPSSB tem conhecimento de alguma destas ilegalidades, deveria, antes de apelar ao instinto protector dos pais, antes de explorar os seus medos e temores, antes de lhes infundir o terror, denunciar tais casos às autoridades competentes. O que ainda não fez. E depois explicar às pessoas que são donos de um negócio, e que o negócio já conheceu melhores dias. E que, por detrás da estrídula retórica, o objectivo último desta campanha infame é cativar clientes. Porque o descaramento tem limites, principalmente quando apela à delação de casos de ATL ilegais contactando a UDIPSSB, que não tem quaisquer competências fiscalizadoras. Melhor seria que fizessem publicidade, sim, mas exaltando as virtudes dos seus serviços. E, já agora, fiscalizar os próprios associados. Denunciando os prevaricadores. Provavelmente, não lhes faltarão motivos para se preocuparem.

Estupidez caucasiana

Uma cidadã guineense, Djariatú Fatú Lopes Mané, foi insultada e quase agredida fisicamente por um imbecil, num parque infantil em frente à igreja dos Congregados, em pleno centro de Braga. A PSP foi chamada ao local e, segundo a queixosa, mostrou-se complacente com a besta agressora, André B., muito para lá do aceitável. André B. deveria ter sido preso imediatamente, por tentativa de homicídio simbólico porque tentou negar a igualdade do outro enquanto indivíduo, desumanizando-o, ensaiando a sua morte cívica. Mas, provavelmente, a PSP deixou André B. ir em paz por ser inimputável.

Barbárie mimada

As universidades nasceram com o intuito de promover a excelência, de criar elites intelectuais que, dotadas de competências superiores e treinadas na exigência do raciocínio complexo, consigam ver mais longe do que a mediania. Mas, conforme demonstrou a peleja absurda que envolveu, anteontem, estudantes universitários do Porto e de Braga, é difícil alcançar tais objectivos quando a perspectiva desses meninos mimados, e a quem tudo é permitido, se tolda tantas vezes com a bebedeira frequente para que julgam estar licenciados. A culpa não é deles é de quem se ri e aplaude, alarve, o espectáculo grotesco do corolário etílico por altura da Queima das Fitas. Patrocinada pelas cervejeiras, que são quem mais mima tão doutos clientes.

Resgate cultural

No meio desta anomia, safam- -se o circo e a bola. Razão teriam os romanos que, para pacificar o Império, concediam ao povo o pão do sustento e o circo do contento. O pão já vai faltando num distrito que acumula desempregados, mas a dimensão circense está bem e recomenda-se em Bracara Augusta o Sporting de Braga lá arrancou um resultado satisfatório na Europa e o Theatro Circo tornou- -se paradigma cultural para o país. Sem alarde.